
Gémeos procuram chegar ao topo do basquetebol*
Simão Cordeniz vai dar o salto. Mas não se trata apenas daquela transposição de lugar que para quem vive nos Açores, a meio do Atlântico, traz um misto acrescido de determinação e aventura; é também “encestar a bola” que se traduz numa esfera de novas oportunidades e diferentes objetivos.
O jovem atleta do Sport Club Lusitânia, de 16 anos de idade, prepara-se para rumar ao Centro Nacional de Treinos (CNT) de Ponte de Sôr e jogar no Sport Clube Beira-Mar, em Aveiro, no seu escalão.
“Estou à espera de evoluir bastante”, adianta Simão Cordeniz, acrescentando que vai dar continuidade aos seus estudos académicos e que tem consciência que, em comparação com a rotina mantida até agora nos Açores, “as coisas vão ser diferentes”.
“Tenho a certeza que vou gostar imenso”, diz.
Até ao momento, Simão Cordeniz soma cinco internacionalizações – duas por Sub 14 em 2022 e três por Sub 15 neste ano.
“Gostei muito. Nesta experiência revi amigos, já estava mais habituado ao nível”, destaca o jovem atleta terceirense, manifestando a sua satisfação por ter sido convocado e, assim, ter feito parte integrante deste estágio.
“Demos muita luta, a equipa era boa”, considera.
Simão Cordeniz tem um irmão gémeo, João Cordeniz, também jovem atleta de basquetebol, o qual transitou neste ano da formação do Sport Club Lusitânia para a equipa senior que milita há mais de duas décadas na Liga Portuguesa de Basquetebol, o patamar mais alto da modalidade no nosso país.
Ambos fazem parte da formação dos “verdes e branco” de Angra do Heroísmo desde o escalão “Minis”(Sub-12).
Neste sentido, Simão Cordeniz conta que começou no AngraBasket e depois passou para o Sport Club Lusitânia, no qual foi acompanhado pelos treinadores Jorge Carvalho e Pedro Loth.
Paralelamente, a família está presente e ajuda a “fazer acontecer”.
“Os meus pais estão a acompanhar essa evolução, apoiam e apostam em mim e no meu irmão”, concretiza Simão Cordeniz.
DOIS PERCURSOS A MESMA BASE
Os gémeos atletas Simão e João Cordeniz seguem caminhos distintos dentro da prática da mesma modalidade– o basquetebol cuja base teve lugar no mesmo clube – Sport Club Lusitânia – manifesta-se agora de modo diverso, com quadros competitivos diferentes, sendo ambos desafiadores e ambos susceptíveis de mudanças significativas na perspetiva da evolução como atletas e cidadãos.
Para o presidente do Sport Club Lusitânia este é o resultado de todo um trabalho que se traduz também nestas palavras: “ser açoriano e terceirense não nos pode nem nos deve demover de sonhar!”.
“É com enorme satisfação e orgulho que vemos os nossos atletas a evoluírem cada vez mais, transpondo a barreira do Atlântico pela sua capacidade de trabalho, persistência e paixão pelo desporto”, declara Luís Carneiro.
Neste seguimento, o líder do emblema da Rua da Sé salienta a importância da formação de atletas na transmissão de princípios e valores que definem o “ADN” desta instituição centenária (1922-2022).
“E que, sem dúvida, passam pelo orgulho de ser “lusitanista” com uma enorme humildade e um espírito de sacrifício, conscientes que o sucesso quer no desporto, quer na vida, apenas se atinge com muito trabalho e respeito pelo próximo”, remata Luís Carneiro.
CRESCER COM TODOS OS SONHOS DO MUNDO
Jorge Carvalho foi um dos treinadores dos irmãos Cordeniz, e, no caso do Simão, na qualidade de técnico que o acompanhou durante três anos, destaca um “grande crescimento”, considerando a parte mais motivadora para um treinador a oportunidade de acompanhar esse crescimento e, por vezes, conseguir moldar e ajudar nesse processo do atleta.
Recorda o seu primeiro treino e refere que, atualmente, olhando para trás diz ver a transformação de um miúdo que praticava desporto para um jovem atleta “com todos os sonhos e ambições do mundo”.
“E o que mais me orgulha como seu treinador é a certeza de que está disposto a lutar e trabalhar para que esses sonhos se tornem realidade”, salienta Jorge Carvalho.
Também Pedro Loth foi treinador dos irmãos Cordeniz e manifesta a sua satisfação e o seu contentamento pela caminhada dos jovens atletas, relembrando que estão ainda “numa fase muito prematura da formação desportiva”.
“Acompanhar de perto a sua evolução e o seu crescimento é motivo de orgulho”, diz Pedro Loth, salientando que “trabalho” e “persistência” foram umas das palavras-chave na transmissão de ensinamentos durante as horas de treino juntos nos pavilhões.
Para o treinador do basquetebol de formação, os irmãos Cordeniz “são já referência” no desporto e na modalidade, no sentido em que diz todos reconhecerem o seu exemplo desde treinadores até colegas e demais meninos e meninas.
Destaca a capacidade de liderança do Simão Cordeniz na sua forma de estar com outros atletas de qualquer idade.
Pedro Loth considera que esta será a primeira geração a olhar para o desporto e nomeadamente para o basquetebol como uma saída profissional.
“E o exemplo do Simão com sucessivas convocatórias e, inclusive, tendo sido capitão da seleção motiva a que mais jovens acreditem que é possível”, sublinha Pedro Loth, ressalvando que “não basta jogar como o Simão, é preciso fazer o treino invisível como o Simão e abdicarem de muitas coisas como o Simão… essa é a parte mais difícil do exemplo a seguir”.
Por seu turno, Jorge Carvalho destaca o talento e a capacidade de aprendizagem do Simão e a força de vontade e o espírito competitivo do João, considerando que ambos são líderes natos, têm paixão pelo jogo e, por isso também, conseguem motivar os colegas em treino e em jogo.
Questionado acerca da importância da vertente familiar na vida de um jovem atleta, Jorge Carvalho considera que se trata do “principal pilar quer para um jovem atleta, quer para um jovem por si só”.
“Os jovens precisam de sentir que têm o apoio da família nas suas decisões e que isso tem um peso gigante na sua evolução”, salienta ao referir que conhece a base familiar dos irmãos Cordeniz e pode dizer que “fazem tudo uns pelos outros”.
PERCURSO SIMBÓLICO
Nuno Barroso, treinador da equipa senior do basquetebol do Sport Club Lusitânia, diz que o percurso dos irmãos Cordeniz pode considerar-se “simbólico para o trabalho realizado no passado recente do clube”. E justifica: “o Lusitânia tem feito um percurso de recuperação muito difícil, onde a dada altura a formação quase desapareceu e tudo teve de começar de novo”.
De acordo com o técnico que está à frente dos destinos dos “verdes e branco” de Angra do Heroísmo, é neste contexto que surge o trabalho de muitas pessoas: de dirigentes a treinadores, passando por pais e atletas, os quais, refere Nuno Barroso, em conjunto e sob a liderança de treinadores competentes, abriram caminho para o desenvolvimento de jovens com talento como os irmãos Cordeniz.
“No caso destes dois jovens há a conjugação de diferentes e decisivos factores que influenciaram o seu percurso até agora, nomeadamente a qualidade dos seus treinadores, o compromisso e a visão dos pais acerca da formação desportiva”, salienta o treinador.
E acrescenta: “e, claro, o talento e a dedicação dos atletas. Importa dizer que na ausência de qualquer deles dificilmente se consegue resultados relevantes no desporto”.
Questionado acerca da eventual primeira geração a ver o desporto e em particular a modalidade como uma saída profissional, Nuno Barroso diz que “outras houve em que essa expectativa também existia”.
“Porém havia e ainda há aspectos culturais que influenciam a acção de todos os agentes e impedem que essa visão se materialize”, salienta.
Nuno Barroso adianta que, no caso dos irmãos Cordeniz, “seria um erro elevar as expectativas a um nível muito elevado” uma vez que “ainda muito pode mudar no seu percurso de formação desportiva”.
Salienta o talento e o compromisso de ambos, o que considera “invulgar no nosso meio”, lembrando que se trata de uma caminhada, com metas e objetivos definidos, mas que, para já, na sua perspetiva, “não se podem esgotar na eventual profissionalização”.
“Estes dois jovens estão a fazer a pré-época com os seniores do Lusitânia e de facto apresentam características, sobretudo intelectuais e volitivas, que definem as pessoas de sucesso, seja no desporto ou em qualquer outra actividade”, concretiza Nuno Barroso.
*Reportagem original publicada na edição de 4 de setembro de 2023 do jornal Diário Insular